Postado por Leo Mesquita on terça-feira, outubro 11, 2011

06:00. Despertador. Levantar. Banheiro. Pijama. Roupa de corrida. Fantasia. Sonho. Realidade. Ansiedade. Lesão. Dúvida. Será? Sim! Vamos. Café da manhã. Elevador. Rua. Gente. Corredores. Atletas. Muita gente! Muitos corredores! Engarrafamento de gente! 45 mil inscritos. 1 milhão nas ruas. Frio? Não! Quente! Muito quente! Entrega do material no guarda volume. Organizado! Muito organizado. Ir para o local de largada. Gente. Mais gente ainda. Engarrafamento. Largada por currais. Banheiro químico. Não! Fila. Muita fila. Filas que nunca imaginaria ver pela espera de um banheiro.  Ir para o curral A. O meu passado de atleta me ofereceu esta condição. Hoje o que eu sou? Atletas da elite mundial logo à frente. Marilson. Brasil. Rayn Hall. Estados Unidos. Moses Mosop. Kênia. Recorde mundial? Acho que não. Recorde sul–americano. Acho que não. Hino americano. Nome dos atletas de elite sendo anunciados. 1 minuto. Sobe a ansiedade. Largou? Sim! Largou! Vamos (eu) lentamente. Estava bem à frente. Passo pelo pórtico de largada. Vamos indo com calma. Deu vontade de chorar. Vou sendo ultrapassado. Sem atropelos. Senti que um grupo grande está logo atrás. Olho para o lado. Placa de 03:00 hs. O grupo das 03:00 hs. O grupo da maratona sub 3 h. O grupo que eu queria pertencer. O grupo que fecha maratona perto das 03:00 hs. O grupo que eu pertenci há 6 meses. Por alguns momentos volto a ser parte dele. Quero mais. Quero ir com eles! Então vamos! Volto a correr no ritmo que corri em maio deste ano. Volto para Porto Alegre. O calor é até semelhante. Chicago está mais quente. Pouco tempo depois estou cansado. Ofegante. Não sou mais o que era. Como conseguia suportar tal condição há tão pouco tempo? Treino! Dedicação! Paciência! Vamos juntos. Eu e grupo das 03:00 hs. Ritmo de 04:20 min/km. É muito forte. É um ritmo de respeito. O público sabe disto. Muitos falam nas calçadas: The threes! O grupo era grande. Respeitado! Vou ficando mais cansado. Não quero atrapalhar. Vou para o canto da pista. Cruzo a primeira ponte. Não irei além da segunda. Nem começou e temos um posto de gatorade. Quente! Frescura? Minha corrida vai acabar logo ali na frente. Vem um posto de água. Quente! Frescura? Voltei! Apenas voltei a correr! Não preciso de mais nada. Voltei a correr. Agora é hora de parar. Sair da prova. Já havia conquistado a minha vitória. Não precisava de mais nada. Saio da prova. Quase 3 meses sem treino. Muitos se surpreendem. Para alguns explico que estou recuperando de lesão. Muitos sabem o que isto representa. Alguns se ressentem com a minha condição. Pra mim não é derrota. É vitória. Recebo mensagens de desconhecidos. Pessoas que aparentemente entendem o esporte. Vou andando pelas ruas de Chicago. Vou para o ponto da meia maratona. Lá quero ver a elite passar. Chego à posição exata com cerca de 40 minutos de prova. A elite deve passar dentro de 23 minutos. No máximo. Passam vários atletas cadeirantes e suas cadeiras adaptadas para o esporte. Não vejo deficientes visuais. Apenas deficientes físicos. Lá vem a elite. O grupo está grande. Marilson segue no meio deles. Na verdade bem no final do grupo. Rayn Hall é o último do grupo. 01:02:48 para o líder. Tempo alto para o recorde mundial. Tempo alto para o recorde sul americano. O calor vai pegar! Passa a elite e eu vou para o outro lado do trajeto da prova. Mais uma corridinha leve. Em que ponto irei reencontrar o trajeto da prova? Não sei. Apenas vou encontrá-lo logo ali. Mais uma vez quero ver a elite passar. Quero concluir a prova junto com o grupo das 03:00 hs. Chego novamente no trajeto da prova. Placa de 800 m. Estou quase na chegada. Vamos mais para frente. Placa do km 41. Tem sombra. Vou ficar aqui mesmo. Converso com a voluntária que fica neste ponto segurando a placa. Ela está no seu segundo turno. Já havia sinalizado o km 11 também. Outra função dela é dar gritos de incentivo para os atletas que passam. E passam os cadeirantes e suas cadeiras voadoras. Fazem muita força. Muita mesmo! O que muitos não fazem com as pernas e os braços, eles fazem apenas nos braços! Passam os carros madrinha. Grupo? Não! Apenas um. Moses Mosop. Vai sozinho. Mais dois atletas. Rayn Hall. Marilson? Passa a primeira mulher! Marilson? Começam a passar atletas que não são da elite profissional. Marilson já era. Com certeza ela já deveria ter passado. Depois fico sabendo que realmente ele havia desistido da prova. Realmente estava quente! Muito quente! Agora é esperar o grupo das 03:00 hs. E nele que embarcarei. De longe vejo algo estranho. Um atleta está completamente alterado. Perdido. Parece num sofrimento extremo. Vai parando. Caminhando para os lados. Caminha para traz. Perdido. Parece em alucinação. Coisa de louco! O cara para e volta a correr a todo instante. O público só pensa em apoiá-lo. A cada arrancada que ele dá muitos gritos são ouvidos. Ele passa pela minha frente. Atleta número 24. Estado deplorável. Sofrimento! Muito sofrimento! Voluntários vêm correndo com copos de água na mão. O técnico vem correndo logo depois. Um galão de 5 litros de água na mão. Que isto! Que loucura. Não posso ficar aqui parado. É comigo! Os voluntários não vão muito longe. Eu vou com ele! Volto para a corrida. Corrida? Que nada! Sou agora um voluntário! O atleta 24 está completamente em alucinação. O técnico completamente desesperado. E entre eles: eu.  Fico com um copo de água na mão. O técnico com o galão de 5 litros. O atleta a cada 50 m bebe um copo e corre um pouco. Parece que ele nos ouve. Corre, para, bebe água. Água na cabeça, água no corpo. Chegamos na placa dos 800 m. Meia milha para chegar. Gritos, muitos gritos. Curva pra direita. Puts! Tem uma subidinha! Tem uma ponte! O cara vai parando. Cheguei a achar que ele não ia para a chegada.  Ali o técnico é impedido de passar. Vamos eu e o cara. Levo um copo de água. Mais uma vez ele para. Reta final. Parece que estou dentro de um estádio de futebol. O cara bebe o último copo de água. Sei lá. 100 ou 200m. Linha de chagada logo ali. Na nossa frente. Bora! Último gás. E vamos. Torcida alucinada! Eu completamente perdido. Linha de chegada. Ele parou antes. Me perguntou se havíamos chegado. Digo que faltavam alguns passos. Ele se segura em mim e damos os últimos passos. Cadeira de rodas já esperando do outro lado do pórtico de chegada. Cruzamos a linha e o cara desaba. Logo me pergunta se terá direito à medalha! Direito? Conquista! Medalha colocada em seu pescoço com todas as honras que um atleta merece. Acho que o tempo de prova para ele fechou com 2 h e 34 min, por ai. Eu não sei quem é ele. Ele nunca saberá quem eu sou. Duas provas. A dele. E a minha! Chicago terá estas duas estórias na minha lembrança. Alucinante!

 

7 comentários:

Unknown disse...

No comments. Emocionante. Emociado. Abs, parceiro

Alessandro S Silva disse...

Emocionante de verdade.

Não tenho comentado muito, mas na medida do possível tenho acompanhado as atualizações.

Abraços!!

Alessandro
http://blog42195.blogspot.com/
@alesilvabr

CORRIDA SEM LIMITES disse...

Passei pra dar um bom dia.
Vamos correr.
abraço

Sergio disse...

Leo,
uma experiência marcante, com certeza. Muita força de vontade sua alinhar para correr tão pouco. O mais difícil do nosso esporte é encarar as lesões e continuar correndo. Parabéns pela ajuda ao atleta anônimo. Se você olhar pelo tempo e procurar um pouco descobre quem é.
grande abraço,
Sergio
corrredorfeliz.blogspot.com

Jorge Cerqueira disse...

---------\\\\|/---------
--------(@@)-------
--ooO--(_)--Ooo--
Léo com certeza foi uma experiência marcante em sua vida e espero que um dia vc retorne a correr esta maratona e com certeza se for correrá melhor parabéns meu amigo.
Pena também que não deu para o Marilson.
Um forte abraço,

Jorge Cerqueira
www.jmaratona.com

Pati Gomes disse...

Leo, Ricardo já tinha me falado do seu post, mas só hoje tive a oportunidade de lê-lo.
Para mim, estas histórias é que tornam o nosso esporte especial. Você tem a possibilidade de deixar sua marca na vida de pessoas desconhecidas, e estas fazem isso conosco também.
Desejo que continue se recuperando, para mais uma vez ter uma ótima história pra nos contar, sua história de sucesso!
Grande abraço!

ivana. disse...

Apenas dizer: E MO CIO NAN TE ! Um beijo.

Search